F.Or.M. (5/4/24) - Não há mais linhas vermelhas para Israel cruzar
Nesta semana, as forças israelenses mataram trabalhadores humanitários, atacaram uma embaixada e inutilizaram o hospital al-Shifa, o principal da Faixa de Gaza
O ataque contra a ONG World Central Kitchen
Na segunda-feira 1º, sete funcionários da ONG World Central Kitchen foram assassinados por um drone Hermes 450 operado pelas forças armadas de Israel, apesar de estarem em um comboio de veículos identificados em uma zona de desconflito e de terem coordenado seus movimentos com as forças israelenses.
Em uma intervenção na CNN, o jornalista israelense Barak Ravid lembrou que episódios como esse ocorrem rotineiramente na Faixa de Gaza, pois as forças armadas de Israel estão se provando uma corporação totalmente indisciplinada.
Na Al-Jazeera, o analista Omar Ashour afirma, por outro lado, que não se trata exatamente de uma situação de indisciplina, mas de um quadro derivado da doutrina militar israelense, que concede enorme autonomia para os comandantes que estão na linha de frente.
Na terça-feira 2, fontes militares informaram ao Haaretz que o ataque aconteceu porque “as unidades no terreno decidem lançar ataques sem qualquer preparação, em casos que nada têm a ver com a proteção das nossas forças”. Ainda segundo o jornal, um homem armado havia sido identificado no comboio, mas ele já havia deixado os veículos quando o ataque ocorreu.
Em uma outra reportagem publicada no mesmo dia, o jornal refuta a tese do Ministério da Defesa de Israel de que o ataque ocorreu por um problema de coordenação com a WCK. Uma fonte do ramo de inteligência afirmou ao repórter que a liderança israelense “sabe exatamente qual foi a causa do ataque – em Gaza, cada um faz o que quer”.
O episódio agravou a situação já desesperadora na Faixa de Gaza. Na quarta-feira 3, o site The New Arab mostrou que, para muitos palestinos, o ataque ao comboio da WCK foi uma tentativa israelense de agravar ainda mais o cenário da fome na Faixa de Gaza.
Também na quarta-feira 3, a ONG Oxfam publicou um levantamento estimando que os palestinos no norte de Gaza estão sobrevivendo com um consumo médio diário de apenas 245 calorias, 12% do recomendado como valor mínimo. A organização acusa Israel de estar “fazendo uma escolha deliberada de matar civis de fome”.
Na quinta-feira 4, o jornal The Washington Post publicou uma reportagem detalhando mais casos de palestinos que sofrem com a crise de fome criada por Israel e também os efeitos de médio e longo prazo sobre quem passa fome, em especial as crianças.
A guerra na Faixa de Gaza
Reportagem publicada pelo Haaretz no domingo 31 indica que o número de mortes de "terroristas" ventilado pelo governo de Israel (9 mil) é uma farsa. Muitos palestinos ganham o rótulo de terroristas após serem mortos, simplesmente por estarem no local errado. Segundo o jornal, há uma regra não-escrita na atuação do exército de Israel que criou "zonas de matança" (kill zones) na Faixa de Gaza. Qualquer um que se aproximar de um perímetro onde estão tropas israelenses pode ser morto, estando ou não armado.
Na terça-feira 2, o Guardian publicou depoimentos de nove médicos que contam, como já fizeram outros ao longo dos últimos meses, que muitos idosos e crianças foram mortos na Faixa de Gaza com apenas um tiro no peito ou na cabeça. Trata-se de um sinal evidente de uma campanha de execução de não-combatentes palestinos.
Depois de revelar, em novembro, a existência do "Evangelho", uma inteligência artificial israelense para destruir edificações, Yuval Abraham, repórter da
+972 Magazine, revelou na quarta-feira 3 a existência de "Lavanda", outra inteligência artificial. Este sistema ajudou Israel a marcar dezenas de milhares de palestinos para a morte. Uma leitura triste e surreal.
Na Foreign Policy, também na terça-feira 2, a analista Mairav Zonszein publicou artigo no qual afirma que “o problema não é apenas Netanyahu, mas a sociedade israelense”. Ela destaca como a guerra é apoiada por amplos setores do eleitorado e argumenta que “os israelenses há muito que avançaram, permitiram ou aceitaram o sistema de ocupação militar e de desumanização dos palestinos”.
Na quinta-feira 4, o Haaretz publicou detalhes de uma carta enviada por um médico israelense ao governo, detalhando os inúmeros abusos aos quais são submetidos os palestinos detidos na Faixa de Gaza. “Nesta semana, dois presos tiveram as pernas amputadas devido a ferimentos com algemas, o que infelizmente é um acontecimento rotineiro.”
A destruição de al-Shifa
Terminou no domingo 31 a operação de duas semanas de Israel nas redondezas do complexo hospital al-Shifa, na cidade de Gaza. O hospital foi completamente destruído e inutilizado, numa ação em que foi usada uma quantidade de força brutal para a qual Israel não forneceu nenhum tipo de explicação. A Al-Jazeera e a AFP mostraram a situação do lugar.
Na segunda-feira 1º. dois jornalistas do Washington Post foram levados por Israel ao hospital Al-Shifa. A reportagem trás elementos que mostram a lógica absurda por meio da qual os militares justificam suas ações em Gaza. Nada é culpa de Israel. Só do Hamas.
Daniel Hagari, porta-voz do Exército, disse que os soldados foram "forçados" a destruir os prédios do hospital. Um coronel completou: "Não tivemos escolha a não ser revidar". Um outro oficial finalizou: "Isso é o que eles nos obrigaram a fazer."
O assassinato de Mohammad Reza Zahedi em Damasco
A morte de Mohammad Reza Zahedi, importante líder da Guarda Revolucionária do Irã, é um ato provocativo de Israel que tem como intuito forçar uma resposta por parte do regime em Teerã e de seu principal aliado, o Hezbollah. Este é o argumento central de artigo publicado na terça-feira 2 na Amwaj.Media.
A Economist também avalia que o assassinato realizado por Israel se trata de uma provocação. O fato de o ataque ter ocorrido no complexo diplomático iraniano torna tudo mais grave, pois embaixadas são protegidas tanto por uma convenção global tácita quanto pelo Direito Humanitário Internacional, por ser um alvo civil.
A revista britânica nota que, se a presença de militares em um prédio diplomático torna o local um alvo lícito, o mesmo valeria para embaixadas de Israel ao redor do mundo.
Na Al-Majalla, o analista Charles Lister afirma que uma resposta iraniana é inevitável e que a forma como o regime decidirá fazer isso vai indicar seu apetite por um confronto aberto com Israel.
Para além da questão Israel-Palestina
Reportagem do jornal emirati The National detalha a instabilidade que vem tomando conta da Jordânia por conta da revolta popular diante das atrocidades em Gaza.
O jornal libanês L’Orient Today conta como o enfrentamento entre o Hezbollah e Israel tem prejudicado a convivência entre muçulmanos xiitas e cristãos no sul do Líbano.
Relatório da Anistia Internacional mostrou que, em 2023, o regime iraniano executou pelo menos 853 pessoas, o maior número desde 2015, que representa um aumento de 48% em relação a 2022. Metade das vítimas tinha condenações por tráfico de drogas. Em 2024, pelo menos 95 pessoas já foram executadas.